Porque sou favorável à austeridade


Pedro, apesar de seres um quanto ou tanto
capitalista neoliberal, estou contigo na austeridade
Tenho ponderado friamente muito sobre as medidas até então tomadas pelo presente governo e também sobre as mais recentes, anunciadas para o orçamento de estado de 2013. E não entro na lógica populista e demagoga do caminho fácil nem do ataque gratuito. Como referia João XXIII, “há uma grande diferença entre dizer mal e apontar o mal" e para apontar "o mal" é necessário ter conhecimento, objetividade, isenção e independência; qualidades que nenhum partido da oposição nem nenhum comentador político que opina na nossa praça têm. Para a esquerda demagoga corresponsável pelo estado em que estamos (falta de isenção e independência), caiu o Carmo e a Trindade e até se usam termos como saque e roubo (como se o Primeiro-Ministro ficasse com o dinheiro para os seus gastos pessoais) e para esta nova ala direita que se apregoa defensora dos pobres, estas medidas são injustas e não criarão emprego. Pois eu digo que as medidas são necessárias e são justas, dadas as condicionantes do país. Este é um repto de um cidadão livre que é funcionário público e que não pertence a qualquer estrutura partidária nem muito menos a qualquer grande banco, financeira ou qualquer agiota associado aos mercados que definham Portugal; escrevo-vos como cidadão livre.

Parece-me ser uma medida positiva, aparentemente, o aumento global das contribuições para a Segurança Social, passando de 34,75% para os 36% (à custa do trabalhador é certo). O facto de ter baixado a taxa para as empresas decorre de uma visão neoliberal, que pode ser positiva, pois dá alguma margem financeira às empresas que estão com problemas de tesouraria. Mas o aspeto que me parece mais interessante e positivo é a fraternidade evocada, ou seja, os que têm trabalho descontarão mais, ajudando aqueles que não têm trabalho e se encontram por exemplo a receber subsídio de desemprego ou alguma outra ajuda do estado. Também é verdade, que em muitos casos, foi um cheque de milhões que foi dado a muitas grandes empresas monopolistas, que por certo o distribuirá pelos seus acionistas, que colocarão esse dinheiro no estrangeiro.

Todavia refiro que só há uma, oiçam bem, só há uma forma, ordeira e moderada, de o país sair da situação financeira extremamente gritante em que se encontra. Os sucessivos governos que reinaram nos últimos anos foram fracos, alienados, populistas e febris; e andando sempre ao sabor das reivindicações idílicas dos sindicatos e dos pensionistas, foram aumentando irresponsavelmente a despesa pública do país. O país a partir de certa altura, já não pagava pensões, subsídios e salários com crescimento económico, mas tão-somente com endividamento. Era preciso corrigir estes desajustamentos, e é o que tem sido feito e no meu entender muito bem.

Um indivíduo só pode ser soberano e livre, quando não tem dívidas e quando tem as contas em dia. A liberdade no mundo moderno atinge-se com a independência financeira. Se estiver endividado com bancos e empresas financeiras, será tudo menos livre, pois terá de alocar muitas horas de trabalho e de prescindir de muitas coisas fundamentais só para pagar juros e dívidas. Se se quer tornar soberano, tem de pagar as dívidas e evitar que tais endividamentos se repitam. Tal com um filho só se torna verdadeiramente soberano quando atinge a independência financeira e deixa de depender dos pais, também um país é mais soberano e livre, quando se liberta das dívidas que tem lá fora; e para tal, o equilíbrio das contas públicas é vital. Os grandes capitalistas mundiais, e os donos dos grandes bancos e financeiras, esfregavam sempre as mãos, quando viam as manifestações da CGTP e dos sindicatos nas ruas de Portugal, reivindicando mais salários. Esfregavam as mãos, pois sabiam claramente que não tendo Portugal condições para pagar o que se reivindicava, a saciação dos salários era feita à custa de endividamento, cujos juros encheriam os bolsos já chorudos dos seus acionistas.

E remeto-me para uma das questões mais ancestrais da filosofia financeira. Quem é o culpado: o gastador ou o usurário? É a culpada a COFIDIS que empresta dinheiro a juros agiotas, ou o neoburguês que o gasta em mariscadas? É uma questão complexa, cuja resposta não é linear. Todavia, eu como português, não quero andar em mariscadas, e quero livrar-me de vez das COFIDIS da nação, a quem pagaremos só em juros cerca de trinta mil milhões de euros. Mas os senhores do PCP, não sabiam que quando reivindicavam mais salários, só o obtínhamos com mais endividamento e menos soberania? Andámos durante anos a encher os bolsos dos grandes bancos com juros agiotas, e agora necessitamos de terapia de choque.

Devo referir que sou veementemente anticapitalista. E como tal, sendo alguém que dá ao capital, i.e. ao dinheiro, o valor que ele merece ter, ou seja muito pouco e apenas para saciar as necessidades básicas, medidas de austeridade são sempre bem-vindas. Os portugueses, não são e nem sei se alguma vez foram, moderados. Com a revolução dos Cravos, um marco histórico de relevo imemorável no país, passámos do miserabilismo salazarista, para o novo-riquismo socialista. A austeridade é a peça fundamental numa sociedade anticapitalista, e oiçam bem, não refiro pobreza, refiro antes austeridade, ou seja, comedimento nos gastos.

Como se explica que em Portugal haja mais telemóveis que pessoas, um dos maiores índices da Europa? Como se explica que Portugal, sendo um país paupérrimo, esteja no terceiro lugar em carros por habitante? Somos dos países com mais plasmas, com mais iPhones e com mais BMW por cidadão! Mais uma vez, não sou favorável à pobreza, ninguém no seu juízo o pode ser, sou todavia bastante favorável à austeridade e à racionalidade, pois estou esperançado que a velha máxima que apregoa que “a necessidade aguça o engenho” se cumpra no nosso caso. Portugal de 1990 a 2004 teve um acréscimo de 140% no seu parque automóvel, os quilómetros de autoestradas que temos fazem da Noruega, um dos países mais ricos do mundo, uma aldeia de província. Enquanto na Noruega, um país rico em petróleo, e onde curiosamente os combustíveis são dos mais caros da Europa, se investiu num crescimento sustentável e racional, que gerou riqueza e estado previdência, por Portugal, cada um quis gastar os seus recursos em carros, autoestradas, telemóveis, plasmas, estádios e vias rápidas - Lisboa é das urbes europeias com mais vias rápidas da Europa.

Este governo tem tido a preocupação de proteger os mais desfavorecidos, e tal é evidente com as diversas medidas, como a preservação parcial de alguns subsídios para os rendimentos mais baixos, nas tarifas dos passes sociais e por exemplo nas isenções das taxas moderadoras na saúde. Mas vejamos mais aspetos positivos da austeridade: há cada vez mais pessoas a andar de bicicleta, uma prática salutar e ecológica; há cada vez mais pessoas a reunirem-se em casa de amigos em vez de bares ou cafés, o que proporciona um ambiente mais familiar e confraternizante, há mais pessoas que passam os domingos em jardins ou em piqueniques e menos em centros comerciais, meros antros do capitalismo e do consumo, e há mais pessoas que moderaram na alimentação, trazendo comida de casa, o que proporciona por norma uma alimentação mais saudável. E por curioso que pareça, apesar dos menores rendimentos disponíveis, as poupanças aumentaram bastante, devido ao clima de receio generalizado pelo futuro.

Para um anticapitalista como eu, que dá o valor às coisas, que as coisas devem ter, e que acima de tudo, usa a razão e a matemática, para a boa gestão do quotidiano, medidas de austeridade são sempre de saudar e são sempre bem-vindas. Com elas, livramo-nos dos agiotas, e espero que com austeridade, saibamos ponderar sobre aquilo a que devemos verdadeiramente dar valor, como os amigos, a família, o saber, os valores transcendentais e metafísicos, e não unicamente aos bens frívolos e fúteis que a nossa sociedade constantemente nos oferenda, quase sempre através da publicidade. E repare que os dados são interessantes: se considerar que as necessidades elementares para o bem-estar do cidadão são alimentação, habitação e transporte, verá que se for poupado em supermercados e se for ao Lidl ou ao Minipreço gasta mesmo muito pouco e enche a prateleira e o frigorífico, verá que consegue uma habitação modesta e confortável nos subúrbios de Lisboa por um preço acessível, e que um passe social custa cerca de 40€; em relação a tudo o resto, aperceber-se-á que é supérfluo.

Quer o meu primeiro conselho para poupar: venda a televisão, consumirá muito menos publicidade que o impelirá a comprar muito menos, aquilo que não precisa nem nunca precisou; e acima de tudo, não se sentirá nem frustrado, nem infeliz. Não há maior frustração, que entrar num centro comercial com a carteira vazia, após ter mamado com meia hora de publicidade nos intervalos de um telejornal.

8 comentários:

  1. Boa noite.
    Vós sois um senhor, com uma capacidade enorme de análise que dá vontade de o pôr a si no governo...para quê tanto latim?! Quando apenas basta meia duzia de frases para resumir o estado do país.
    Quando você nasceu já eu cá andava há alguns anos,por acaso o senhor viveu a sua juventude no tempo do Salazar? Tenho 40 anos, não tenho muito aptidão pela escrita, mas você leva-me a colocar-lhe algumas questões : Em que partido vota? Está satisfeito com o desempenho do partido em que votou?
    Eu sou um apartidário e defensor da liberdade da condição humana...será que existe algum partido que pense num sentido humanitário? Os respnosaveis pelo estado do pais são todos os partidos que existem na assembleia da republica...aliás, penso que depois do 25 de Abril temos todos vivido debaixo dum ditadura parlamentar...os partidos são como clubes de futebol, procurando adeptos para serem maiores, exploradores da mente humana...onde está o sentido do Homem, na condição de ser humano em todo o seu explendor? Caro João, você não pecisa de apoiar o Passos Coelho, abrace causas humanitárias, ajude quem precisa, dê pão a quem tem fome, ajude quem sofre na pele com o desemprego, existem familias carenciadas...não tente ser um entendido em " sei lá o quê ", eleve a sua alma ajudando...Portugal será sempre o ultimo reduto da Europa...sempre o foi, e continuará a ser...os responsáveis quem são? com certeza que não são os cidadãos deste país, esses somente querem viver a VIDA. Agora pergunto-lhe o seguinte : O que fará pelo futuro dos seus filhos? O que fará pelos seus netos?...

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    1. Meu caro

      Antes de mais devo dizer-lhe que a culpa, se é que se pode falar de culpa, esse sentimento cristão, para o estado lastimável em que se encontra o país é de TODOS. Desde o plebeu que se orgulha de fugir aos impostos, até ao deputado corrupto. Não foram os sucessivos governos eleitos pelo povo? O povo votou neles. Em segundo lugar, digo-lhe que não votei neste governo, mas se fosse hoje tê-lo-ia feito pois como já expliquei, se queremos ser soberanos temos de pôr as contas em dia e de pagar as dívidas que temos.

      Tenho pena, que o povo só se mobilize, quando vem a conta para pagar! Então e quando nos andávamos a endividar em larga escala, por que é que a oposição de esquerda não se exaltou?

      Em relação à minha filantropia e cariz humanitário, devo dizer-lhe que faço parte voluntariamente de várias associações cívicas de mobilidade, que já dei explicações gratuitamente na Santa Casa, que apanho regularmente lixo da minha rua, que ajudo o próximo quando posso, que tenho um fórum na internet onde esclareço dúvidas de matemática gratuitamente e ainda escrevo voluntariamente para a maior enciclopédia que o mundo já conheceu.

      Saudações

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  2. João Pimentel Ferreira, você é comunista e não se tinha apercebido, já viu?

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    1. Caro Zé.
      Sou comunistas, mas sou totalmente contra formas de autoritarismo e despotismo. Daí ser favorável à via de Guterres, a terceira via...

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  3. João,

    Quero gabar-te a lucidez de te colocares ao lado da austeridade num momento como este.

    Aproveito para te convidar a ler um artigo que escrevi sobre a mais recente medida de austeridade: http://www.cousasliberaes.com/2012/09/a-descida-da-tsu.html

    Um comentário: tal como 99% dos portugueses, parece-me que utilizas a palavra "neo-liberalismo" sem perceber bem o seu significado. Talvez possas vir a conhecê-lo melhor. Para dar uma luz, quando foi criado o termo foi definido como "“the priority of the price mechanism, the free enterprise, the system of competition and a strong and impartial state.”[6] To be “neoliberal” meant that “laissez-faire” liberalism is not enough and that - in the name of liberalism - a modern economic policy is required" (Wikipedia)
    Friso a parte do estado forte e imparcial e da necessidade de ir para além do laissez-faire (esse sim, o que se poderá apelidar de capitalismo selvagem) para se conseguir uma sociedade livre.

    Um abraço

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    1. Olá Bernardino.

      O problema do neoliberalismo, é que ao colocar grandes empresas, fundamentais para a nação e monopolistas, nas mãos de privados com ativos estrangeiros, o interesse público nacional fica comprometido.

      Para o neoliberal, o termo competitividade serve de jugo para trabalho escravo, mal pago, fazendo do ser humano mais uma peça da engrenagem. Já para não falar nas assimetrias gritantes causadas no planeta terra, entre "1º mundo" e mundo subdesenvolvido.

      Eu sou favorável à austeridade, não por ser neoliberal, mas por gostar de assumir compromissos, e neste caso, são as contas que o país tem para pagar.

      Mas entristece-me por exemplo que o PM e o ministro da saúde (numa ótica neoliberal) venham dizer que acham que os políticos em Portugal, ganham pouco, ou que António Borges, diga que se deva baixar salários. Aqui tangemos o extremismo na ótica neoliberal.

      Abraços

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  4. Concordo consigo quando diz que devem ser tomadas medidas, que este país tem andado sem rei nem rock demasiado tempo.

    Porém, subir a TSU à custa do trabalhador é diminuir o poder de compra, de forma obrigatória para todos os trabalhadores. Isto podia ser feito com contra partida do IVA (mais vale o IVA e cada um compra o que quer/pode do que aumentar a TSU e à partida as pessoas terem menos dinheiro para pagar despesas fixas como a renda, água ou luz).

    Ok que diminuir a TSU das empresas pode dar essa "liquidez" a certas empresas que bem precisam. Porém, tal como há subsídios de apoio social a desfavorecidos e pensionistas com necessidades acrescidas, esta medida podia ser "filtrada" apenas a empresas que o requeressem e que provassem a sua necessidade, evitando lucros astronómicos de grandes empresas e mantendo o apoio às empresas que precisassem. Concordo com os comentadores da hasta pública: esta medida não vai trazer mais emprego como o primeiro ministro diz.

    Finalmente, na minha opinião pessoal o que falha nas medidas do governo é que vemos 2 medidas, 2 pesos. O povo tem que apertar o cinto, perdendo subsídios de férias/natal, mas o dinheiro público tem que servir para pagar esses mesmos subsídios dos deputados? Que em média já recebem mais de 5500 euros? É justo a Presidente da assembleia ter uma "reforma" de mais de 7000 euros como ex-juíza do Tribunal constitucional? Que eu saiba quem trabalha não tem reforma.
    Seja como for, como podem pedir ao Zé Povinho que pague mais quando se olha para cima e o exemplo que se vê é o contrário?

    De resto, sim austeridade é necessária para ultrapassar os problemas do país, mas falta cortar lá em cima...

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    1. Caro RV

      Concordo inteiramente consigo. A austeridade é necessária, mas deve começar por cima, por quem nos governa. Se pensarmos que o nosso PM assim como o ministro da saúde, disseram recentemente que acham que os políticos ganham mal, num país com tantas dificuldades, então há alguma coisa que não está bem. As medidas de austeridade são necessárias para parar a sangria (como muito bem diz Passos Coelho) de várias dezenas de anos de loucura de endividamento.

      Também concordo que a TSU deveria ser mais seletiva. Já não concordo com a questão que refere do IVA. O IVA já é altíssimo, e já tange o saque ao consumidor. Não conheço país do mundo que tenha IVA acima de 23%. Agora, acho que carros de luxo, jóias, e iates por exemplo, deveriam ter uma IVA de pelo menos 50%. E o mesmo para o IRS. Segundo consta, Hollande criou uma taxa de 75% para o IRS para rendimentos superiores a 1 milhão de euros.
      http://www.dinheirovivo.pt/Economia/Artigo/CIECO058639.html?page=2

      Em relação às mordomias que refere dos governantes, concordo inteiramente consigo.

      Cumprimentos

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