Estórias de bicicleta - O Taxista, o lobo velho e incivilizado da estrada


Agarrava nos punhos do volante da minha bicla e questionava-me sobre o facto de, com tantas e evidentes vantagens que conseguia atingir com este meio de transporte – financeiras, de saúde, e altruísticas como menos poluição, menos barulho e menos espaço na cidade, menos importações de combustíveis e veículos – e mesmo assim, os outros utentes da via, tratavam-me como um empecilho. Não passam de profanos, no sentido etimológico do termo, pois desconhecem as grandes vantagens de se ver a Luz. E eu, e também os outros poucos que são os ciclistas urbanos, havíamos visto a Luz. E para se ver a Luz é preciso Saber: não admira portanto que paradoxalmente são os academicamente mais letrados e os mais abastados que adotam a bicicleta, mesmo que o comum dos mortais, plebeu e profano, trabalhe cinco meses do ano para pagar as despesas do seu carro.

Todavia, pedalar em Lisboa, é (ainda) um pouco aventureiro, dada a animalidade intrínseca que os profanos das bolhas enlatadas manifestam ao volante. As autoridades policiais encaram a bicicleta no mínimo com desconfiança, uma espécie de elemento invasivo e parasita da via pública, e eles, guardas e polícias de trânsito, quais glóbulos brancos que defendem a ordem viária contra os ataques exógenos, encaram ainda a bicicleta como uma afronta contra o sistema imunitário viário. Mas são os taxistas, os elementos da via pública que manifestam um comportamento mais agressivo e perigoso perante os ciclistas, tal prende-se com o facto de os ciclistas - infringindo o Código da Estrada para sua segurança - circularem com regularidade nas vias BUS; os taxistas, essas feras velhas e decrépitas da rodovia, esses mamutes poluidores e iletrados que fazem da via BUS uma via de aceleração, colocam constantemente em risco a segurança dos ciclistas, com as tangentes e razias que nos fazem no dia-a-dia. 

É sobre estes paradigmas que versarão as minhas estórias. Tratam-se de estórias reais, factuais, que presenciei e que vivi na primeira pessoa, não são novelas ficcionais.

O Taxista, o lobo velho e iletrado da estrada 

Se o INE se dedicasse a aferir o nível académico médio dos indivíduos que conduzem um táxi, espantar-me-ia se o dito grau ultrapassasse a quarta classe. 
 - “Pai, tenho a quarta classe e estou desempregado”; 
- “Filho, tira a carta e vai para a guarda, e se não der conduz um táxi”. 
O estereótipo do taxista é aquele velho, da velha guarda, iletrado, que em tempos tirou a carta de condução, cujo requisito mínimo é saber ler e escrever, e foi conduzir um táxi. E se pensarmos bem, alguém que só sabe ler e escrever, o que mais pode fazer, senão tirar a carta de condução e ir conduzir um táxi?

E por acaso não ia ciente deste paradigma quando descia a Av. da República na via da direita, na via BUS, quando um energúmeno de um taxista me ultrapassa a mais de 110 km/h a menos de meio metro, ao mesmo tempo que buzina para me “alertar”. Apanhei um cagaço tão grande que ainda agora mesmo, vários dias depois, tremo de medo, só de sentir aquele néscio a passar por mim a mais de 110 km/h a meio metro ao mesmo tempo que buzina. Fiquei tão lixado que disse para mim mesmo: “Se te apanho estás f0d!b0”. Mas lá passou, lá acalmei e como bom cristão perdoei-lhe a sua ofensa, mesmo que o seu gesto tenha posto em causa de forma grave, a minha segurança enquanto ciclista. 

Estava eu ainda em fase de acalmia, na fase em que orava ao Nosso Senhor, para que me desse forças para perdoar aquele infrator que seguia em claro excesso de velocidade, respirava eu fundo à medida que as forças divinas me purgavam de todos aqueles sentimentos nefastos e vingativos que nutria por aquele profano taxista filho do Senhor, quando nisto, um segundo taxista tem exatamente a mesma atitude um pouco mais à frente: passa por mim a trinta centímetros de distância, a mais de 100 km/h e para me “avisar” buzina alto e em bom som. “F6D@-S€”, desta vez gritei bem alto e andei aos ziguezagues na bicicleta durante quinze segundos tal foi o susto. “@#&”””@#£%#”£§§#” gritei eu em tom mais exacerbado. É que seguia mesmo de forma completamente calma e tranquila, quase em modo automático, de forma serena e pacata, quando este segundo animal faz ainda pior do que havia feito o primeiro. Como dizia Cristo, se te batem numa face dá a outra, pois eu já tinha dado as duas, logo à terceira, ou dou o ânus, ou vou-lhe à boca. “Espero que não haja terceira” penso eu!

Segui então sempre ao longo da Av. da República do lado direito na via BUS, atravessei a avenida de Berna (sempre no verde), segui até Entrecampos e chegado à praça de Entrecampos, pus-me na ciclovia ao longo do Campo Grande. Segui depois calmamente pela ciclovia com que o Eng. Ferreira de Oliveira da galp atira areia para os olhos dos ciclistas mais incautos. Aquela ciclovia, que tem o logótipo da galp no pavimento, é clara propaganda nefasta e ludibriadora da maior petrolífera portuguesa, a mesma empresa que fatura milhares de milhões por ano, com o excesso de tráfego automóvel nas cidades, significando que mais bicicletas, significa menos carros e menos lucros para a galp. Como se diz em inglês: “greenwashing”, o mesmo método que usa a BP, quando o seu logótipo é um girassol e as suas estações de serviço funcionam a energia solar. Gosto da técnica de mercadologia, acho que vou criar uma cadeia de bordeis, com meninas de 19 anos acabadinhas de chegar do leste, e para logótipo, acho que vou adotar uma nossa senhora de Fátima! Ou quem sabe, lembra-me também aquelas marcas de salsicha de carne de porco, cujo logótipo é um leitão bem sorridente com alguns traços humanos, dando a entender que o pobre animal adora ser eletrocutado, fatiado, triturado e posteriormente moldado em forma de salsicha para assim, saciar a necessidade do consumidor.

E então, lá para o meio da ciclovia do Campo Grande, quando precisava de voltar à direita para a ciclovia da avenida do Brasil para ir até casa, deparo-me com o sinal verde para os velocípedes. Todavia, o semáforo estava amarelo intermitente para os automóveis que vinham de cima do Campo Grande, do museu da cidade, que precisavam de virar às suas esquerdas para irem para a avenida do Brasil. Estava amarelo intermitente porque estava verde para os peões e para os velocípedes. E lá ia eu a atravessar com cuidado, ciente do meu verde, quando um taxista faz a curva ao estilo rally (deve ter atravessado já perto do vermelho) e quase que me atropela; foi mesmo por pouco. Eu apanho um susto e fico mesmo fod!90 mas engoli em seco e não lhe pronunciei um pio, mas a panela de pressão estoirou quando o c@b8ão buzinou bem alto e mandou umas bocas. Bem… fiquei aí tão fod!90 mesmo que lhe chamei alto e bom som, aos berros todos os nomes inimagináveis: aquelas adjetivações que tornam indignos a mãe, o pai, a sua orientação sexual ou a fidelidade da esposa. E continuou a retorquir e a fazer alaridos, quando foi então que atravessei a estrada, deitei a bicicleta ao chão e me dirigi ao condutor do táxi (um tipo obeso para os seus 50) e perguntei-lhe pessoalmente o que queria, tendo continuado a berrar (como berram os caprinos) e a chamar-me todos os nomes impróprios verbalizados na segunda pessoa do singular, referindo adicionalmente que os ciclistas são uns animais na estrada, que deveríamos andar no passeio, que nunca deveríamos poder andar na via BUS, algo como “seus cab***, o vosso lugar é no passeio seus cabr***, qualquer dia passo por cima de um e fujo, e depois quero ver como é”. O tipo dizia-o mesmo em frente a mim, de dentro do carro, sem pestanejar com o vidro bem aberto. Ora eu fervilhava num misto de sangue à flor da pele, e de adrenalina que me corria nas veias. Puxei o braço direito atrás, fechei o punho firmemente, e espetei um murro violento no vidro esquerdo traseiro! Aquela material é meio elástico (nunca tinha visto nada assim) e não partiu, fiquei com o nó dos dedos ensanguentados e o tipo assustado, fugiu. 

Talvez a besta ao volante, ganhe mais respeito pela integridade física dos outros utentes da via pública pois podia ter sido um peão, uma criança, um velhote ou outro qualquer utilizador vulnerável. O sinal estava verde para as bicicletas e para os peões. Tomei a atitude errada quando adotei um método mais violento, mesmo que nunca tivesse posto em causa a sua integridade física, algo que ele não fez ao conduzir de forma mais agressiva; mas acho sinceramente que a estirpe do taxista que circula nas cidades, deveria receber lições assertivas e obrigatórias de civismo na estrada. Também penso que como são pessoas que passam muitas horas enfiadas dentro de uma cabina de um veículo, sem descansar ou parar, ficam sujeitas a situação de muito estresse e ansiedade, degenerando em comportamentos agressivos na estrada, algo que é comum em países muito carro dependentes onde as pessoas passam muitas horas no trânsito, como a Rússia ou vários países da América Latina.

Senhores governantes: para quando exames de código obrigatórios a cada cinco anos, com aulas de civismo na estrada, para os denominados “choferes profissionais”?

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