Por uma questão de soberania nacional


Raramente ouso falar de política nacional no meu blogue introspectivo e de enlevo emocional e poético. Raramente comento questões de foro efémero como as que passam nos meios de comunicação nacional. Tudo o que vemos na televisão tem um cariz normalmente tão fútil e efémero, tão volátil, normalmente a informação dilui-se no tempo e passados alguns meses já ninguém se lembra do défice ou da denominada geração à rasca. No entanto não posso deixar de comentar alguns recentes acontecimentos propalados por certos sectores da esquerda nacional.

Protestam contra os cortes salariais e contra a precariedade, vociferam “Precários nos querem, Rebeldes nos terão”, aclamam os jovens a sair á rua e fazem sempre de Sócrates o malfeitor que trouxe o país para o presente estado de crise.

Relembro a estes jovens revolucionários que o cerne da crise é o nosso endividamento externo, pois se não estivéssemos tão dependentes financeiramente do exterior teríamos tido uma reacção muito mais robusta para enfrentar a crise. Eliminar o défice é completamente fulcral para que sejamos soberanos. Todas as mordomias que fomos tendo ao longo da democracia foram conseguidas com o endividamento externo. Quisemos ter um estilo de vida europeu ocidental sem termos a produção da média europeia, sem gerarmos a riqueza que se cria na Europa. Para os portugueses o estado surgiu sempre como um protector paternalista que tem de estar sempre presente para sustentar financeiramente quaisquer indivíduos.

Queremos os ordenados da Alemanha mas não temos uma Mercedes, uma BMW, uma Siemens, uma Schindler, uma Bosch, uma Volkswagen, uma Grundig ou uma Opel. Queríamos ter a segurança social da Finlândia mas não pagamos 50% de impostos nem temos uma Nokia. Queremos a educação gratuita da Suécia mas não temos uma Volvo ou uma Ericsson. Gostávamos de ter as condições laborais da França mas não temos uma Peugeot, uma Citroën, uma Alcatel ou uma AirBus. Gostávamos de ter as benesses laborais que têm os Holandeses mas não temos uma Philips e protestamos porque os espanhóis não pagam certas auto-estradas e têm os combustíveis mais baratos mas não temos uma Seat, uma Fagor ou uma Zara.

Os portugueses têm de uma vez por todas de se mentalizar que não podem auferir o que ganham os cidadãos de certos países da Europa se não produzirmos o que eles produzem. Portugal não tem uma marca de renome automóvel, não temos uma marca de renome em grande escala no campo das telecomunicações, electrodomésticos ou de equipamentos electrónicos. Limitamo-nos tal como sempre fizemos ao longo da história desde a nossa decadência que começou nos finais do século XVI a copiar o que os outros fazem e a importar este género de equipamento do exterior desequilibrando fortemente a nossa balança comercial. Quando é que o povo se mentaliza que enquanto não tivermos um sector industrial produtivo forte e em grande escala não conseguimos ter o nível de vida europeu. Os sectores fortes em Portugal são os serviços e a banca, ou seja o sector terciário. O nosso sector secundário é parco.

Distribuição da população portuguesa por sector de actividade - fonte INE


Portugal sempre se limitou ao longo da sua história desde a decadência pós-descobrimentos a limitar-se a importar o que provinha do estrangeiro. Os portugueses gostam de abraçar as novas tecnologias, gostam das mordomias que a tecnologia nos oferenda, gostam de ter automóvel próprio, querem o electrodoméstico de ponta, mas tudo isso é importado e apenas contribui para o nosso endividamento externo.

Só há uma forma de sermos verdadeiramente soberanos: É eliminar o défice. E este governo deu os passos correctos e difíceis nesse sentido, sendo que deveria ter ido muito mais longe nas medidas tomadas. O dinheiro do estado deve servir para apoiar o sistema produtivo nacional e dinamizar e desenvolver o sector primário. Até nos alimentos estamos dependentes. Se houver uma crise ou uma escassez grave de alimentos temos de nos sujeitar aos agiotas estrangeiros que nos especularão brutalmente.

Apraz-me saber que os preços dos combustíveis subiram bastante! Para mim a gasolina deveria custar 10€/litro. Tal forçar-nos-ia a criar um sistema ainda mais eficiente de transportes públicos nas metrópoles, far-nos-ia desenvolver seriamente a ferrovia para não estarmos dependente do transporte rodoviário de produtos e tornava-nos verdadeiramente soberanos. Portugal no seu percurso democrático fez um grande investimento estratégico completamente errado: A rodovia. Fizemos imensas auto-estradas, espalhamos estradas pelo país. Quais as viaturas que circulam nas estradas? Automóveis e camiões! Ora nós não temos indústria automóvel nem produzimos camiões, e muito menos temos recursos petrolíferos. Tornamo-nos assim extremamente dependentes do exterior. Importámos para circular nas nossas estradas recém-constituídas todos os automóveis e camiões, e importamos por sua vez o combustível que os fazem circular. Tornámo-nos com este grande investimento em estradas extremamente dependentes do estrangeiro. Será que as vias de comunicação rodoviárias são assim de extrema importância para o desenvolvimento de um país que não tem indústria automóvel nem recursos petrolíferos?

Porque é que não apostámos seriamente na ferrovia? Porque é que não dinamizámos o sector produtivo? Portugal agora está na mão de meia dúzia de agiotas internacionais que nos vêm cobrar o dinheiro que nos emprestaram durante anos. Dissolvemos o sector piscatório e compramos ultra-congelados da PescaNova espanhola, esquartejámos o sector agrícola e compramos fruta e legumes aos espanhóis. Em tempos construímos as naus que nos levaram à Índia e ao Brasil, agora endividamo-nos seriamente para comprar dois submarinos.

Pergunto às elites portuguesas: Quando é que Portugal será verdadeiramente soberano?
Eu tenho a resposta: Quando reduzir seriamente os ordenados dos funcionários públicos e a despesa pública para eliminar o défice com o intuito de reduzir seriamente a dívida do estado ao exterior! Quando equilibrarmos a balança comercial e quando tivermos um sector produtivo competitivo e em massa e quando expulsarmos de vez os agiotas e interesseiros que definham e estrangulam as finanças portuguesas. Quando migrarmos a população do sector terciário para o sector secundário e primário. Somos uma colónia de férias das elites europeias, temos turismo pois o todo-poderoso agraciou-nos com uma meteorologia aprazível e exportamos algum calçado e muito vinho. De resto, onde está a indústria nacional de relevo?

Portugal no presente momento não é soberano! E a esquerda demagógica contribui para esta falta de soberania com as suas reivindicações idílicas, impraticáveis e utópicas. Quando é que os senhores do PCP, dos sindicatos e do Bloco de Esquerda se mentalizam que uma família que ganha 1000€/mês não pode gastar 1100€/mês a não ser que fique dependente dos agiotas, usurários e especuladores? E vêm sempre com o argumento ridículo e falacioso da melhor distribuição de riqueza, esquecendo-se que é natural e meritório que um gestor aufira mais que um servente de obra. Lembremo-nos até que o sistema fiscal é de certa forma justo pois taxa de uma forma crescente em percentagem quem tem mais rendimentos.

Mas o que me entristece é que Sócrates não tomou estas medidas de austeridade, sérias e necessárias, por uma questão de consciencialização nacional, fê-lo antes porque paradoxalmente foi obrigado a fazê-lo devido a pressões externas, nomeadamente o cumprimento do pacto de estabilidade europeu.

Unamo-nos todos numa causa comum, paguemos aos especuladores e agiotas o que lhes devemos e dinamizemos o sector produtivo nacional. Migremos para as fábricas, para as quintas e para o mar. Tal como ansiava Pessoa, cumpramos Portugal.

1 comentário:

  1. Amigo João
    Depois de ter lido este teu manifesto, não posso estar mais de acordo contigo.
    É, efectivamente, a nossa soberania nacional que tem sido e está sendo cada vez mais alienada.
    Tocaste nos pontos fulcrais com uma enorme clareza e lucidez.
    Amo demais Portugal para o ver cair desta maneira, mas sinto-me, eu e certamente a maioria dos portugueses, profundamente impotente perante a situação.
    Dizia noutro dia Rui Rio, o presidente da Edilidade Portuense, que a resolução da actual situal económica e financeira do nosso país não vai lá só com uma mudança de governo, pois os problemas estruturais que Portugal enfrenta há décadas são transversais a qualquer governo com o seu ideário.
    É necessário uma nova forma de fazer política, um novo regime, um novo entendimento do que é democracia, um rasgo de lucidez que nos permita encarar os problemas reais de uma forma honesta, e dar-lhes uma resposta que NÃO É, creio firmemente, aquela que as elites europeias querem que demos. Quando é que - e esta para mim é a questão ética fundamental - quando é que a nossa classe política deixa de querer governar nas base de interesses pessoais, clientelismos e influencias e passa a SERVIR? Minister em Latim quer dizer Servo, saberão isso os nossos políticos? Estarão dispostos a entregar todos os interesses pessoais, e a começar a Servir Portugal? É necessário, efectivamente, e como dizes parafraseando Pessoa, cumprir Portugal e, direi eu, resgatá-lo das mãos dos senhores de Bruxelas a quem hipotecámos a nossa liberdade.
    Quando é que Portugal se tornará um país livre? Quando é que Portugal se encontrará consigo próprio e dirá: somos capazes?!
    Já fomos grandes e temos um desígnio de grandeza e de liderança.
    Encontra-te, Portugal, e levanta a cabeça!

    João Carlos

    ResponderEliminar