Saldo fiscal entre o automobilista contribuinte e o Estado


Toda a gente sabe que os automobilistas em Portugal pagam muitos impostos, mas também não creio que os próprios automobilistas acreditem que as autoestradas, e todo o sistema rodoviário que lhes é providenciado, seja barato; pelo contrário, é muito caro e é pago por todos os contribuintes. Depois há as chamadas externalidades negativas para o país e sociedade que a massificação do automóvel acarreta como as emissões de poluentes atmosféricos, as emissões de gases de efeito de estufa, a poluição sonora, a sinistralidade rodoviária, o congestionamento e o desgaste das infraestruturas rodoviárias. Segundo a fonte mais fidedigna nesta matéria, que reporta a um estudo alargado da Universidade de Delft, que é a grande referência em toda a União Europeia para as externalidades no sector dos transportes, estas externalidades têm um custo em Portugal de cerca de 1,5% do PIB. Interessa então, parafraseando o Dr. Medina Carreira "fazermos contas"! 

Apresenta-se na tabela a contabilidade na relação financeira entre o Estado/Público e o automobilista/contribuinte. Tive a ajuda preciosa dos meus caros amigos especialistas em transportes João Bernardino e Mário Alves. Apresento valores individuais, ou seja valores mensais em média para cada veículo. Considere-se ainda que há cerca de 5 milhões e 600 mil veículos (motorizados excetuando motociclos) em Portugal, sendo que as contas são feitas por veículos e não apenas automóveis pois todos os veículos motorizados também pagam impostos e também beneficiam das rodovias, como por exemplo camiões, carrinhas ou autocarros. 

ENCONTRO DE CONTAS ENTRE
OS AUTOMOBILISTAS E O ESTADO EM PORTUGAL
Proveitos para o Estado
Parcela Valor total
Valor mensal por cada veículo
ISP - Imposto sobre Produtos Petrolíferos
35€
ISV - Imposto sobre veículos
7,4€
IUC - Imposto Único de Circulação
4,4€
Multas do Código da Estrada
0,95€
Portagens
4,3€
TOTAL
3,55 mil milhões de euros
52,05€
Custos para o país e para o Estado
Externalidades dos veículos motorizados 

emissões de poluentes atmosféricos,
emissões de gases de efeito de estufa,
poluição sonora,
sinistralidade rodoviária,
congestionamento,
desgaste das infraestruturas rodoviárias

1,5% do PIB
2,4 mil milhões de euros

35€
Montante do Orçamento de Estado injetado na Estradas de Portugal

A EP tem como única missão providenciar rodovias ao país com a respetiva manutenção. Incluem-se custos de PPP rodoviárias, financiamento, amortizações e custos gerais de infraestuturas rodoviárias

1,77 mil milhões de euros

25.8€
Estradas e sinalização rodoviária municipal

10% do valor alocado ao poder local no OE2014.Os 10% baseiam-se no rácio que resulta da divisão entre as despesas de construção e manutenção de infraestruturas rodoviárias e sinalética; e as despesas totais do município da Lisboa

270 milhões de euros

4.04€
TOTAL
4,44 mil milhões de euros
64.84€
SALDO
-890 milhões de euros
-12,79€

Cada automobilista deveria endividar-se assim para com o Estado e o país, em 12,79€ por mês, mesmo já considerando todos os impostos que já paga enquanto automobilista. O que um político sério faz perante estas assimetrias, e que está de acordo mesmos com as ideologias liberais, é internalizar estes custos no agente económico, ou seja, trocando por miúdos, os automobilistas deveriam ser ainda mais taxados, para que o saldo em apreço fosse zero.

10 comentários:

  1. Portanto, se platonicamente excluirmos todos os veículos a motor de portugal, deixariam de entrar nos cofres do estado 3,55 mil milhões de euros, sendo que as vias de circulação de veículos continuariam a precisar de manutenção se não houvessem veículos a motor a circular, em menor escala naturalmente, mas continuariam a precisar, pois não são só os veiculos a motor que provocam o desgate das vias, as condições atmosféricas tem um papel muito importante no desgate como é sabido, o dinheiro para essas manutenções iria ser captado de que modo? Sendo que as bicicletas não pagam absolutamente nada no que respeita a impostos o balanço seria compensado retirando dinheiro aos hospitais? às escolas? às pensões? aumentava-se os impostos? Tenho pena não ter "linkado" o estudo da Universade de Delft, acção que seria mais útil ao leitor, do que mencionar por palavras suas "Segundo a fonte mais fidedigna nesta matéria...." , "que é a grande referência em toda a União Europeia para as externaldiades no sector dos transportes". Já agora quanto custa um desempregado ao país? Um doente de baixa? Um reformado? ... parafraseando o Dr. Medina Carreira vamos fazer as contas.... enfim...

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    1. Caro Nuno

      A hiper-ligação para o estudo está na tabela na linha respetiva, mas pode também clicar aqui caso queira.

      Percebo o seu ponto. Pode discutir-se se as estradas devem estar inseridas no bolo daquilo que o Estado deve pagar ou não, e até que ponto. Acho que faz sentido defender que, grosso modo, não deve, pela mesma razão que o Estado não oferece automóveis a pessoas com carências económicas. Caso contrário, ao financiar estradas estaria a subsidiar essencialmente as pessoas com dinheiro para ter um automóvel. Outro exemplo: todos concordamos que o vestuário é um bem essencial para os cidadãos, e no entanto o Estado não o subsidia. Então porque devem as estradas para utilizar o automóvel ser subsidiadas pelo Estado? É totalmente válido o argumento de que as estradas servem para outras coisas (algumas delas eventualmente subsidiáveis) que não o automóvel, mas também é verdade que se não fosse pelo automóvel particular não precisaríamos de metade das estradas que temos, e que outros tipos de utilização das estradas também pagam alguns impostos (à exceção talvez da bicicleta).

      A maioria das autoestradas em Portugal estão além disso sobredimensionadas, tendo tido um custo que pode chegar a 5000€ por metro. A nossa rede de estradas não está feita a pensar no país, está a feita a pensar na população que tem automóvel. Se tivéssemos os automóveis que tinhamos em 1980, ou seja 1/4 do que temos hoje, teríamos uma rede de estradas muito mais pequena e eficiente, e sem imputar ao bem comum, ou seja a todos os contribuintes, custos astronómicos em construção e manutenção.

      Cumprimentos

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    2. E respondendo à primeira parte da pergunta, sim! Mas se "platonicamente" o fizessemos também deixaríamos de ter custos na ordem dos 4,44 mil milhões de euros. Precisaríamos obviamente de mobilidade, mas não confundir automóvel com mobilidade, é um erro crasso e muito comum que se comete em Portugal.

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  2. Parece-me otimismo considerar só 270 milhões de euros como gastos das 300 câmaras municipais e das 3 mil freguesias com construção e manutenção de infraestruturas rodoviárias e sinalética. Quanto ao investimento autárquico e nacional na rodovia, estamos em tempo de vacas magras; parece-me que a única forma de se apurar valores mais conformes com a realidade portuguesa é abranger as contas das últimas décadas, em que se gastou, quer a nível nacional, quer a nível local, valores astronómicos.

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    1. Muito obrigado pelo comentário, valorizo bastante o seu trabalho. O valor surgiu da divisão desses custos com os custos totais na câmara de Lisboa, vezes o valor injetado no OE2014 nas autarquias. É naturalmente uma aproximação. Geralmente falando não estamos propriamente em tempo de vacas magras por causa das PPP rodoviárias que têm custos correntes na ordem dos milhares de milhões por ano.

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  3. Boa tarde, parece-me que a interpretação dos números relacionados com as externalidades deve ser efetuada cuidadosamente. O congestionamento não gera custos sobre terceiros, a não ser o dos próprios utilizadores do sistema rodoviário (através dos atrasos que suportam), mas somente ineficiência do sistema. Ou seja, os custos do congestionamento (que é uma externalidade de 'clube') já são suportados pelos próprios, pelo que não podem entrar nas contas apresentadas. Se aos números de Delft for retirado o valor relativo ao congestionamento é capaz de haver surpresas!

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    1. Pode ser de um custo de "clube" mas parece-me que tem impactos negativos sistémicos em toda a economia. E mesmo a medição dos custos ambientais e de vidas perdidas é muito relativa.

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  4. Para nota sobre esta matéria, quero deixar bem vincado, que, estranhamente, o governo decidiu estupidamente fundir a Estradas de Portugal com a Refer, numa nova empresa denominada Infraestruturas de Portugal. Este tipo de fusão dilui os brutais custos que a rodovia tem ao país, como PPP rodoviárias ou manutenção de autoestradas e pontes, nos custos comparativamente muito inferiores, que tem a infraestrutura ferroviária.

    Digo-o porque o número que acima se apresenta para o valor injetado na Estradas de Portugal não foi apresentado no Relatório e Contas da EP, e se analisado o dito relatório, após contabilidade "artística" dos seus autores, depreende-se que a rodovia tem custos muito inferiores aos 1,7 mm€. Todavia não pode haver cifra mais clara para obter o verdadeiro custo da rodovia, do que o valor que o Orçamento de Estado injetou na Estradas de Portugal, considerando a missão que tinha empresa pública. Considerando ainda que o governo funde os dois tipos de infraestruturas numa única, e que como referido, os relatórios deste tipo de empresas públicas são crípticos e herméticos na asserção clara de quanto custa verdadeiramente a infraestrutura ao país, ficará muito mais difícil doravante estabelecer quanto realmente custa aos cofres públicos a rodovia.

    Este é mais um caso, que demonstra que este governo não tem qualquer estratégia coerente para a mobilidade do país, não distinguindo, ferrovia de rodovia, englobando tudo em "infraestrutura". Perdoai-me o coloquialismo, seria como se em sua casa não distinguisse uma pia para defecar de uma mesa para almoçar, englobando tudo em "artigos para a casa". Este é um governo pérfido e "petrolificado"!

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  5. Dúvidas sobre os dados:

    Do lado das receitas?
    1. Onde estão as receitas do IVA dos veículos automóveis e sobre os combustíveis?
    2. Onde estão as receitas associadas às concessões das infra-estruturas consideradas nos custos das PPP rodoviárias?
    3. Onde estão as receitas do IRC e IRS das 15.000 empresas e respectivos trabalhadores do sector automóvel correspondentes a cerca de 7% do PIB ?

    Do lado dos custos:
    1. Como se chegou aos 2.4 mil milhões (1.5% do PIB) relativos aos poluentes, e gases de efeito de estufa?
    2. Porque se considera o congestionamento uma externalidade quando o mesmo é absorvido directamente pelos automobilistas congestionados?

    Agradecido desde já pelos esclarecimentos.

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    1. Receitas

      1) Não tem lógica colocar IVA, pois IVA pagam todas as atividades económicas, desde um café a uma estadia num hotel. Nenhum estudo que mensure o impacto do automóvel considera IVA. Da mesma forma que quando bebo um café, não vou pedir ao estado para fazer contabilidades considerando esse IVA que paguei, pedindo para ser ressarcido de alguma forma por esse mesmo valor. Todos os impostos, por defeito são não consignados, mas se há impostos que é mesmo não-consignado, esse imposto é o IVA.

      2) Quais receitas de concessões, se o estado apenas paga? Pode especificar?

      3) E por que motivo essas receitas deveriam ser consideradas? Parece-me que nao faz a mínima ideia do que é uma externalidade. Da mesma forma que, segundo a sua visão mais abrangente, as minhas férias nas Caraíbas têm externalidades positivas, porque após o descanso fico mais produtivo, e por conseguinte, o estado deve financiar férias nas Caraíbas.

      Custos

      1) A fonte é a União Europeia, tem lá os links
      2) Porque o congestionamento é uma externalidade, e porque não afeta apenas o automobilista congestionado, mas todos os outros automobilistas e a sociedade em geral. E não sou eu que o digo, é a literatura científica do campo dos transportes!

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